quarta-feira, 15 de agosto de 2007

Sou os arredores...

Fernando Pessoa – Livro do Desassossego.

“Sou os arredores de uma vila que não há, o comentário prolixo a um livro que se não escreveu. Não sou ninguém, ninguém. Não sei sentir, não sei pensar, não sei querer. Sou uma página de romance por escrever, passando aérea e desfeita sem ter sido, entre os sonhos de quem me não soube contemplar”.

Quem me salvará ?

Fernando Pessoa em O Liuro do Desassossego.

"Ah, quem me salvará de existir? Não é a morte que quero, nem a vida; é aquela outra coisa que brilha no fundo da ânsia, como um diamente possível numa cova a que se não pode descer...É toda a falta de um Deus verdadeiro que é o cadáver vácuo do céu alto e da alma fechada. Cárcere infinito - porque és infinito, não se pode fugir de ti!"

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segunda-feira, 13 de agosto de 2007

Convivência Teológica

John Wesley
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"No essencial, unidade; no não essencial, liberdade; em tudo, caridade."
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A PARÁBOLA DA MENTE ESTREITA

“Histórias que Abrem a Janela Mais Ampla de Deus”, DeVern Fromke, Edições Tesouro Aberto
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Certo dia, ao atravessar uma ponte, vi um homem em pé na beirada a ponto de pular. Corri, então, em sua direção, e disse-lhe: “Pare! Não faça isso!”
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“E por que eu não deveria?”, perguntou ele.
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Eu disse: “Bem, há tanto pelo que se viver!”.
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Ele disse: “Como o quê?”
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Eu disse: “Bem, você é religioso ou ateu?”
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Ele disse: “Religioso”.
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Eu disse: “Eu também. Você é católico ou protestante?”
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Ele disse: “Protestante”.
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Eu disse: “Eu também! Você é episcopal ou batista?”
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Ele disse: “Batista”.
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Eu disse: “Puxa! Eu também! Você é da Igreja Batista de Deus ou da Igreja Batista do Senhor?”
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Ele disse: “Igreja Batista de Deus”.
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Eu disse: “Eu também! Você é da Igreja Batista de Deus Original ou da Igreja Batista de Deus Reformada?”
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Ele disse: “Igreja Batista de Deus Reformada”.
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Eu disse: “Eu também! Você é da Igreja Batista de Deus Reformada em 1879 ou da Igreja Batista de Deus Reformada em 1915?”
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Ele disse: “Igreja Batista de Deus Reformada em 1915!”
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Eu disse: “Então morra, seu herege!”, e, com imenso desgosto, o empurrei.
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sexta-feira, 3 de agosto de 2007

COMPLEXIDADE ÍNTIMA

Paulo de Tarso na Carta aos Romanos.

“Miserável homem que eu sou! Quem me livrará do corpo desta morte? ”. (7:24).

“Porque o que faço não o aprovo; pois o que quero isso não faço, mas o que aborreço isso faço.“ (7:15).

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RAÍZES

Mia Couto.

Uma vez um homem deitou-se, todo, em cima da terra. A areia lhe servia de almofada. Dormiu toda a manhã e quando se tentou levantar não conseguiu. Queria mexer a cabeça e não foi capaz. Chamou pela mulher e pediu-lhe ajuda.

- Veja o que me está a prender a cabeça.

A mulher espreitou por baixo da nuca do marido, puxou-lhe levemente pela testa. Em vão. O homem não desgrudava do chão

.- Então, mulher? Estou amarrado?

- Não, marido, você criou raízes.

- Raízes?

Já se juntavam as vizinhanças. E cada um puxava sentença. O homem, aborrecido, ordenou à esposa:

- Corta!

- Corta, o quê?

A esposa puxou da faca e lançou o primeiro golpe. Mas logo parou.

- Dói-lhe?

- Quase nem. Por que me pergunta?

- É porque está sair sangue.

Já ela, desistida, arrumara o facão. Ele, esgotado, pediu que alguém o destroncasse dali. Me ajudem, suplicou. Juntaram uns tantos, gentes da terra. Aquilo era assunto para camponês. Começaram a escavar o chão, em volta. Mas as raízes que saíam da cabeça desciam mais fundo que se podia imaginar. Covaram o tamanho de um homem e elas continuavam para o fundo. Escavaram mais que as fundações de uma montanha e não se vislumbrava o fim das radiculações.

- Me tire daqui, gemia o homem, já noite.

Revesaram-se os homens, cada um com sua pá mais uma enxada. Retiraram toneladas do chão, vazaram a fundura de um buraco que nunca ninguém vira. E laborou-se semanas e meses. Mas as raízes não só não se extinguiam como se ramificavam em mais redes e novas radículas. Até que já um alguém, sabedor de planetas disse:

- As raízes dessa cabeça dão a volta ao mundo.

E desistiram. Um por um se retiraram. A mulher, dia seguinte chamou os sábios. Que iria ela fazer para desprender o homem da inteira terra? Pode-se tirar toda a terra, sacudir as remanescentes areias, disse um. Mas um outro argumentou: assim teríamos que transmudar o planeta inteiro, acumular um monte de terra do tamanho da terra. E o enraizado, o que que se faria dele e de todas as raízes? Até que falou o mais velho e disse:

- A cabeça dele tem que ser transferida.

E para onde, santos deuses? Se entreolharam todos, aguardando pelo parecer do mais velho.

- Vamos plantar a cabeça dele lá.

E apontou para cima, para as celestiais alturas. Os outros devolveram a estranheza. Que queria o velho dizer?

- Lá, na lua.

E foi assim que, por estréia, um homem passou a andar com a cabeça na lua. Nesse dia nasceu o primeiro poeta.

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quinta-feira, 2 de agosto de 2007

A MAIOR SOLIDÃO

Vinicius de Moraes

“...a maior solidão é a do ser que não ama. A maior solidão é a do ser que se ausenta, que se defende, que se fecha, eu se recusa a participar da vida humana. A maior solidão é a do homem encerrado em si mesmo, no absoluto de si mesmo, e que não dá a quem pede o que ele pode dar de amor, de amizade, de socorro. O maior solitário é que tem medo de amar, o que tem medo de ferir e de ferir-se, o ser casto da mulher, do amigo, do povo, do mundo. Esse queima como uma lâmpada triste, cujo reflexo entristece também tudo em torno. Ele é a angústia do mundo que o reflete. Ele é o que se recusa às verdadeiras fontes da emoção, as que são o patrimônio de todos, e, encerrado em seu duro privilégio, semeia pedras do alto da sua fria e desolada torre”.

SE EU FOSSE UM PADRE

Mário Quintana

Se eu fosse um padre, eu, nos meus sermões,
não falaria em Deus nem no Pecado
- muito menos no Anjo Rebelado
e os encantos das suas seduções,

não citaria santos e profetas:
nada das suas celestiais promessas
ou das suas terríveis maldições...

Se eu fosse um padre eu citaria os poetas,
Rezaria seus versos, os mais belos,
desses que desde a infância me embalaram
e quem me dera que alguns fossem meus!

Porque a poesia purifica a alma
... a um belo poema - ainda que de Deus se aparte -
um belo poema sempre leva a Deus!

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quarta-feira, 1 de agosto de 2007

A Oração ao Deus Desconhecido

Friedrich Nietzche

Antes de prosseguir em meu caminho
e lançar o meu olhar para frente uma vez mais,
elevo, só, minhas mãos a Ti na direção de quem eu fujo.

A Ti, das profundezas de meu coração,
tenho dedicado altares festivos para que, em
Cada momento, Tua voz me pudesse chamar.

Sobre esses altares estão gravadas em fogo estas palavras:
“Ao Deus desconhecido”.

Seu, sou eu, embora até o presente tenha me associado aos sacrílegos.
Seu, sou eu, não obstante os laços que me puxam para o abismo.
Mesmo querendo fugir, sinto-me forçado a servi-lo.

Eu quero Te conhecer, desconhecido.
Tu, que me penetras a alma e, qual turbilhão, invades a minha vida.
Tu, o incompreensível, mas meu semelhante,
quero Te conhecer, quero servir só a Ti.